PUBLICIDADE

As cidades do futuro não têm carros voadores mas pessoas felizes

Por Cidades e Serviços
Última atualização: 11/05/2022
,

Freedom young woman carefree and happy with open arms on blue sky with hypnotizing sky in background. Caucasian girl in white shirt and jeans, feeling happiness enjoying her travel vacation
PUBLICIDADE
PUBLICIDADE

As cidades que conhecemos hoje vão mudar substancialmente. Mas será que veremos os carros voadores e edifícios com formas incomuns como nos habituamos a ver em séries, filmes e até apresentações comerciais de startups trendy? O mais provável é que não, e que a mudança não seja tão espectacular e ficcional, mas antes uma transição repetida do atual paradigma, centrado no automóvel, para um modelo de desenvolvimento centrado nas pessoas. Desejavelmente, as cidades do futuro terão a ver com certeza, com um ambiente urbano mais humano e inclusivo, onde as pessoas possam estar e circular em segurança, sem se sentirem condicionadas por um modo de transporte.

Os congestionamentos que ocorrem sempre nas mesmas horas, todos os dias, nas mesmas ruas e avenidas; os níveis de poluição atmosférica muitas vezes acima de índices aceitáveis e que levam ao aumento de casos de doenças respiratórias; e o ruído constante que tantas vezes torna desconfortável a vivência da cidade, principalmente ao ar livre, são alguns dos problemas que resultam de um desenvolvimento urbano que cedeu a uma indústria como o objetivo de se tornar uma das maiores e mais lucrativas a nível mundial – um dos grandes motores do capitalismo. Assim, diante da falência dos projetos de aumento da qualidade de vida e a incidência das crises torna-se cada vez mais claro que a forma como as cidades foram desenhadas até aqui atingiu um ponto de saturação. Na verdade, o atual modelo de desenvolvimento urbano tem-se mostrado insustentável do ponto de vista social, ambiental e econômico. 

As cidades desenhadas primordialmente para carros são cidades inóspitas e inseguras. A infraestrutura automóvel não favorece o desfrute do espaço público porque geralmente domina esse espaço, secando como um eucalipto as hipóteses de vida urbana em seu redor. Cidades carregadas de vias rápidas, de túneis, calçadas estreitas e desconfortáveis, e onde há um convite aberto à velocidade e à aceleração, mesmo dentro dos bairros, são perigosas para quem tenta deslocar-se fora de um carro, ou para quem queira brincar ou estar na rua. Promovem inevitavelmente a utilização do automóvel e convidam até os que preferem deslocar-se de outra forma a ceder ao carro.

As vias rápidas e os túneis que há tempos foram construídos para facilitar as deslocações quotidianas, numa visão de mobilidade individualista e unimodal, têm-se revelado estruturas dispendiosas de manter por parte dos governos centrais e locais, contribuindo para o endividamento público e resultando em faturas que só ao fim de várias gerações poderão ser pagas finalmente. Essas mesmas vias rápidas e túneis, que em alguns locais serviram para desbastar determinados bairros – como comunidades segregadas que não tinham voz para protestar e reclamar os seus direitos –, tornaram o carro algo imprescindível para inúmeras famílias por todo o mundo – passamos a ser dependentes do automóvel porque o desenho da cidades assim o determinou.

As cidades do futuro, o automóvel não é o centro das atenções – apesar de continuar a ter, claro, o seu papel na mobilidade urbana. As cidades do futuro dão, em primeiro lugar, espaço e conforto ao andar a pé, ao transporte público e à bicicleta; tratam estas formas de mobilidade com a dignidade que merecem, ao mesmo tempo que apostam numa filosofia de proximidade. Nestas cidades do futuro, as distâncias entre a casa, os locais de trabalho, as instituições de ensino, os serviços do dia-a-dia e as infraestruturas culturais são curtas – não superiores a 15 minutos a pé ou de bicicleta, ou a 30 minutos de transportes públicos. Os bairros são espaços dinâmicos e multifuncionais, onde conseguimos suprir todas as nossas necessidades e, por isso, não precisamos do carro. São zonas seguras, onde se pode estar, brincar na rua ou conviver com a vizinhança. Perto de casa temos cafés, supermercados, espaços de convívio e outros serviços que preenchem as nossas necessidades e caprichos cotidianos. Há espaços verdes onde se pode passear e levar o nosso animal de estimação. Há praças e lugares onde encontramos pequenas feiras e onde se promovem outras atividades lúdicas. Há hortas comunitárias onde podemos plantar as nossas frutas e legumes e compartilhá-las com o nosso bairro.

Nas cidades do futuro, somos livres para sair de casa e optar pela bicicleta como meio de transporte porque vamos encontrar ruas calmas e seguras, e ciclovias nas principais avenidas para deslocações utilitárias ou recreativas entre bairros. O transporte público tem prioridade nas ruas em relação ao transporte individual e existem ruas só com transporte público, é complementado com a bicicleta e o andar a pé, e é utilizado por todos os tipos de pessoas, deixando de ser sinônimo de um status social. Nas cidades do futuro, o bem estar, a saúde mental, a ansiedade e o conforto de todas as pessoas – independentemente do seu gênero ou condição física – são questões centrais no desenho urbano. As cidades do futuro resolvem os problemas que tanto infernizaram as cidades do passado, como o congestionamento que nos faz perder tempo e dinheiro ou a poluição que provoca doenças respiratórias.

Falamos essencialmente de mobilidade e de espaço público porque a forma como nos movemos e como estamos na cidade determina a forma como nos relacionamos com o espaço e uns com os outros. Ao humanizar a mobilidade e ao tornar o espaço público mais inclusivo, estamos privilegiando as relações humanas e a potenciar encontros entre pessoas. As cidades do futuro são mais que palcos de materialização de grandes dinâmicas do capitalismo, são mais que mega fábricas de produtividade e consumo. As cidades do futuro são espaços de encontro, de convívio; promovem relações humanas que permitem libertar todo o potencial criativo e de inovação que se gera ao concentrar numa área relativamente pequena muitas pessoas e pessoas de diferentes locais e culturas. Só tirando as pessoas dos carros, esse símbolo do individualismo, e trazê-las para a rua é possível promover estes contactos, promovendo comunidades e relações.

O futuro não é assim tão distante e cabe aos decisores políticos, e aos habitantes de cada cidade, definir o tempo que a transição urbana durará. Se de alguns locais nos chegam vislumbres de cidades mais humanas e inclusivas, de cidades para pessoas, noutros pontos do mapa parece haver uma maior resistência a essa mudança. Como todas as mudanças, esta vai ser muito difícil de se implementar porque mexe com hábitos, costumes e preconceitos, acarreta desafios tecnológicos, de engenharia, de aspecto financeiro (a mudança é dispendiosa) e ao nível da infraestrutura. Também por isso, é fundamental uma comunicação boa e clara que chegue às pessoas e que as envolva nas decisões. Uma política que não seja pensada só por políticos mas que seja baseada na participação das populações; que não seja meramente impositiva, mas a que não falte ambição e visão. As cidades do futuro podem ser as cidades de hoje. Já o são em muitos países, por aqui estamos à distância da mudança de mentalidades do futuro.

 

Fonte: São Paulo São

PUBLICIDADE
PUBLICIDADE